segunda-feira, 25 de março de 2013

 
 Gato que brincas na rua
  Gato que brincas na rua
  Como se fosse na cama,
  Invejo a sorte que é tua
  Porque nem sorte se chama.
 
  Bom servo das leis fatais
  Que regem pedras e gentes,
  Que tens instintos gerais
  E sentes só o que sentes.
 
  És feliz porque és assim,
  Todo o nada que és é teu.
  Eu vejo-me e estou sem mim,
  Conheço-me e não sou eu.    
 
Fernando Pessoa, 1931


sábado, 23 de março de 2013


HORA DO PLANETA
 

Hoje celebra-se em todo o mundo a Hora do Planeta.

Das 20:30 às 21:30, em todos os fusos horários, há um simbólico apagão mundial.

Junta-te também a esta campanha  de conservação do meio ambiente.


quinta-feira, 21 de março de 2013



Versos! Versos! Sei lá o que são versos...
Pedaços de sorriso, branca espuma,
Gargalhadas de luz, cantos dispersos,
Ou pétalas que caem uma a uma...
 
Versos!... Sei lá! Um verso é o teu olhar,
Um verso é o teu sorriso e os de Dante
Eram o teu amor a soluçar
Aos pés da sua estremecida amante!
 
Meus versos!... Sei eu lá também que são...
Sei lá! Sei lá!... Meu pobre coração
Partido em mil pedaços são talvez...
 
Versos! Versos! Sei lá o que são versos...
Meus soluços de dor que andam dispersos
Por este grande amor em que não crês...
 
Florbela Espanca, in "A Mensageira das Violetas"


terça-feira, 19 de março de 2013



Há Palavras que Nos Beijam
 
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
 
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
 
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.
 
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)
 
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
 
Alexandre O'Neill, in “No Reino da Dinamarca”


sexta-feira, 15 de março de 2013

 
Linda...esta carta escrita pela Joana Ferreira, do 6ºC. 
 


CARTA À AVÓ
                                                                         
                                             
                                                     Tavira, 19 de março de 2006
         Querida avó
 
Cá por baixo está tudo bem, eu tenho tido boas notas tal como a minha mana. Os meus pais continuam a trabalhar, mesmo com a crise.
Espero que tu, estando aí em cima, já tenhas feito muitos amigos. Calculo que tenhas ido para o céu, pois é o local adequado para um anjo.
As tuas asas devem ser grandes, pois sempre ouvi dizer que quanto mais bondosa a pessoa fosse maiores seriam as suas asas. As tuas, o céu inteirinho e um bocadinho da terra, não? Digo isto porque, às vezes, olho para o céu e vejo uma grande ponta de asa, brilhante e com penas bem branquinhas.
Quero que saibas que lamento muito a doença que te afetou, mas vê o lado positivo, vais fazer novos amigos e talvez reencontrar outros. No entanto, eu, cá na terra, vou até ao fim da minha vida tentar encontrar a cura para a leucemia, pois, graças a ela não te posso ver, só sentir e ouvir, mas sei que estarás sempre ao meu lado. Continuando, vou arranjar a cura porque tu já cá não estás, mas talvez algumas pessoas, boas ou más, consigam cá ficar com a minha ajuda. E como tu sempre me aconselhaste a não desistir, se não conseguir fazê-lo, vou pedir aos meus descendentes que acabem a minha missão.
Gostava muito de te ir visitar, mas o ar que nos separa é demasiado.
Espero que me respondas, contando a tua vida.
Cumprimentos terrenos para uma avó aérea.
 
Joana Sol Ferreira
6ºC
 

quinta-feira, 14 de março de 2013


 
 

AS LENTAS NUVENS FAZEM SONO
 
As lentas nuvens fazem sono,
O céu azul faz bom dormir.
Bóio, num íntimo abandono,
À tona de me não sentir.
 
E é suave, como um correr de água,
O sentir que não sou alguém,
Não sou capaz de peso ou mágoa.
Minha alma é aquilo que não tem.
 
Que bom, à margem do ribeiro
Saber que é ele que vai indo...
E só em sono eu vou primeiro.
E só em sonho eu vou seguindo.
 
Fernando Pessoa


domingo, 10 de março de 2013


 

INSUBMISSÃO
 
Somos corsárias
febris
por areias dos desertos
 
Seguimos estrelas cadentes
e montando os nossos sonhos
cumprimos roteiros incertos
 
Vamos atrás das paixões
com o faim à cintura
e a pena no coração
 
Para escrevermos poesia
invertendo o cantochão
 
Com a arte da insídia
olhamos o horizonte alucinando
os oásis, abismando sortilégios
 
Escutamos os clamores
os oceanos celestes
nos silêncios dos desertos
 
Buscamos os infiéis
com olhos de expiação
 
Somos hábeis e seguras
ambíguas, doces, cruéis
nós partimos sem regresso
 
Ora flibusteiras
em horas de cerração
entre a paixão e o inverso
 
Ora piratas do limbo
abandonando os arquétipos
 
A cimitarra à cintura
e o júbilo no coração
pelo avesso dos versos
 
Somos a rosa e o espinho
a sombra no seu desvão
 
Entre o fuso e o enigma
a navalha entreaberta
e os nevoeiros secretos
 
Somos corsárias
sonhando
nas areias dos desertos
 
 
Maria Teresa Horta
 


sexta-feira, 8 de março de 2013



   Os Transparentes, Ondjaki, Caminho

Um prédio de águas rejuvenescedoras na Luanda perdida pelo dinheiro, acossada pela ambliopia, condenada ao fogo pela ganância, onde transparência e leveza servem o paradoxo de emprestar visibilidade a quem até aí nem se via. A maturidade com que Ondjaki trabalha o português angolano é digna dos melhores ourives da língua.




    O Teu Rosto Será o Último, João Ricardo Pedro, D. Quixote
Tudo começa com um homem saindo de casa, armado, numa madrugada fria. Mas do que o move só saberemos quase no fim, por uma carta escrita de outro continente. Ou talvez nem aí. Parece, afinal, mais importante a história do doutor Augusto Mendes, o médico que o tratou quarenta anos antes, quando lho levaram ao consultório muito ferido. Ou do seu filho António, que fez duas comissões em África e conheceu a madrinha de guerra numa livraria. Ou mesmo do neto, Duarte, que um dia andou de bicicleta todo nu.
Através de episódios aparentemente autónomos - e tendo como ponto de partida a Revolução de 1974 -, este romance constrói a história de uma família marcada pelos longos anos de ditadura, pela repressão política, pela guerra colonial.
Duarte, cuja infância se desenrola já sob os auspícios de Abril, cresce envolto nessas memórias alheias - muitas vezes traumáticas, muitas vezes obscuras - que formam uma espécie de trama onde um qualquer segredo se esconde. Dotado de enorme talento, pianista precoce e prodigioso, afigura-se como o elemento capaz de suscitar todas as esperanças. Mas terá a sua arte essa capacidade redentora, ou revelar-se-á, ela própria, lugar propício a novos e inesperados conflitos?
 
    Teoria Geral do Esquecimento, José Eduardo Agualusa, D. Quixote 
 
Luanda, 1975, véspera da Independência. Uma mulher portuguesa, aterrorizada com a evolução dos acontecimentos, ergue uma parede separando o seu apartamento do restante edifício - do resto do mundo. Durante quase trinta anos sobreviverá a custo, como uma náufraga numa ilha deserta, vendo, em redor, Luanda crescer, exultar, sofrer. Teoria Geral do Esquecimento é um romance sobre o medo do outro, o absurdo do racismo e da xenofobia, sobre o amor e a redenção.
Para os pais lerem... e Ondjaki para os filhos.

Dia Internacional da Mulher
PORQUÊ O DIA 8 DE MARÇO
Neste dia, do ano de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque entraram em greve, ocupando a fábrica, para reivindicarem a redução de um horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas. Estas operárias que, nas suas 16 horas, recebiam menos de um terço do salário dos homens, foram fechadas na fábrica onde, entretanto, se declarara um incêndio, e cerca de 130 mulheres morreram queimadas. Em 1910, numa conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca, foi decidido, em homenagem àquelas mulheres, comemorar o 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher". De então para cá o movimento a favor da emancipação da mulher tem tomado forma, tanto em Portugal como no resto do mundo.


domingo, 3 de março de 2013

AO MIA COUTO


Elefantemos portanto.

Deixemos esta tão precária pele

Aprender outros saberes

Deixemos

Portantomente

O olhar do paquiderme

Ensinar ao passarinho

As paisagens do deslumbre

Das escritas mais antigas.

Permitamos que o vento sopre.

E que a pedra exista.

E que o sol dispare a sua fúria

Em todas as direções.

E que a lua se entretenha

No seu jogo de brilhar.

Elefantemos portanto.

Ou,

Melhor dizendo,

Permitamos que um silêncio muito antigo

Venha

Carregado de silvos e sussurros

Venha

Conduzir-nos a palavra

Pelas veredas impalpáveis

Do mistério.

    José Fanha, Elogio dos Peixes, das Pedras e dos Simples