Ciganos em 1960
“Os Ciganos”, inédito de Sophia de Mello Breyner que o neto terminou,
é história de liberdade
14.10.2012 - 16:36 Por
Lusa
A primeira edição de 3.000 exemplares, segundo
fonte da editora, “deverá esgotar rapidamente, a avaliar pelos pedidos feitos
que ultrapassam em dois terços esta cifra”.
A edição identifica a azul a primeira parte do
conto, da autoria de Sophia de Mello Breyner Andresen e preto a escrita pelo
neto.
O jornalista Pedro Sousa Tavares estreia-se literariamente
ao ter aceitado a proposta da tia, a poetisa Maria Andresen de Sousa Tavares,
para terminar o conto que em 2009 foi encontrado no espólio da poetisa.
Sousa Tavares levou cerca de oito meses a escrever
e a encontrar um final que não desvirtuasse o início da história idealizada
pela avó, para tal “muito contribuiu” o nascimento do segundo filho do
jornalista.
“Como fiquei em casa e tirei férias, aproveitei
para começar a ordenar ideias”, disse.
A “ponte” entre a narrativa de Sophia e a de Pedro Sousa Tavares “é um
gato” que acidentalmente surgiu à janela do jornalista sempre que este se
colocava ao computador. Gato a quem o autor chamou “Polícia”.
A justificação do batismo é dada por uma das
personagens do conto, “Gela”: “Ele [o gato] entra pelas nossas carroças sem
pedir licença e deixa tudo desarrumado. Por isso ficou com esse nome”.
Em declarações à Lusa, Sousa Tavares afirmou:
“Escrevi à minha maneira o final daquele livro”, referindo em seguida “a forma
muito característica de escrever de Sophia, que tinha uma escrita na sua
essência”.
“Tentar imitá-la era fazer uma caricatura. Procurei
seguir algumas coisas, como o “respeito pelas palavras’ que Sophia tinha, e
utilizá-las só pelo sentido de que deviam estar lá e não por questões
estéticas”, referiu.
Outra preocupação do jornalista foi “ter em conta o
destinatário da história, que serão os rapazes/raparigas a entrarem na
adolescência e que estão na fase da descoberta. Do descobrir além da zona de
conforto do lar, e descobrir o que queremos”.
“Ruy” é a personagem principal do conto. “Já não é
um rapaz pequeno, mas ainda não era um rapaz crescido”, escreve Sophia. Este
rapaz vive numa casa que não lhe parece ser sua, com muitas regras e rotinas e
se parecia antes “um tribunal”.
Certo dia, o rapaz é surpreendido pelo tocar de um
tambor que o desafia a saltar o muro do jardim, a percorrer os campos e
aproximar-se de um acampamento de ciganos, e “Ruy seguiu os ciganos”. Foi neste
ponto que parou a narrativa de Sophia.
Para Pedro Sousa Tavares, Sophia fez “um retrato
dos ciganos nos anos 1960, mas remete para a imagem dos ciganos que
correspondia aos da sua juventude, em que havia os circos de ciganos que hoje
não sabemos exatamente o que são”.
“Estes circos não usariam animais amestrados”,
referiu Sousa Tavares, que fez alguma pesquisa sobre a comunidade cigana e
utilizou na narrativa algumas palavras do seu dialeto, o caló.
O autor lamentou “haver poucas fontes portuguesas
sobre os ciganos”, mas optou por utilizar “elementos da cultura cigana menos
óbvios como certas tradições, nomeadamente a das fadas do destino”. Estes seus
ciganos são nómadas, leem a palma da mão, tocam guitarra, cantam e dançam, além
de executar números de circo como andar sobre um arame.
Pedro Sousa Tavares optou por “salientar valores da
comunidade cigana que à primeira vista não se notam, como o apreço pela
família, o respeito pela natureza e o sentido de comunidade”.
“Os ciganos são uma minoria com uma cultura
própria, fortemente enraizada, por ser transmitida oralmente de geração em
geração”, salientou.
O jornalista não faz quaisquer projetos literários,
tendo afirmado à Lusa que “terminar este conto foi um fim em si mesmo e não um
meio para atingir qualquer outro fim”.
Neste momento afirmou estar “a apreciar a
experiência”. “Foi uma oportunidade que surgiu e não quero pôr o carro à frente
dos bois”, rematou.
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