PÉROLAS
DA SÉTIMA
ARTE
TERAPIA A DOIS
Título
original: Hope Springs (2012)
Realização:
David Frankel
Argumento:
Vanessa Taylor
Elenco:
Meryl Streep, Tommy Lee Jones e Steve Carell
Por mais que o título português seja traduzido de uma forma
objetivamente específica, chega a ser desconfortável porque em aparência reduz
a narrativa a uma inofensiva e simples comédia romântica, coisa que este Terapia a Dois
sabe ser, mas que se revela também capaz de superar. Aliás, o realizador David
Frankel já tinha demonstrado mais que uma vez, mas especialmente com The Devil
Wears Prada (2006), que sabe trabalhar o cinema de género, cumprindo os
clichés, mas tornando-os bons. Especialmente porque além de se notar que sabe o
que é cinema, rodeia-se de bons atores e de um argumento plausível, competente
e emocional o que, sejamos francos, faz grande parte do trabalho. É também este
o caso, já que o grande tour de force
do filme é a interpretação soberba dos dois atores protagonistas, repleto de
nuances, genuíno e que consegue oscilar entre a comédia e o mais intrincado
drama com uma ligeireza invejável.
O filme, apesar do seu tom cómico, retrata de uma forma
bastante crua e honesta, os dilemas de um casamento de longa duração e a vida
de um casal de meia-idade. Logo aí temos algo que desarma de imediato o
espectador: a raridade de ver algo do género no cinema. As relações que se
tornam frias, a rotina, o comodismo e o afastamento a nível emocional e sexual
de um casal já foram por variadíssimas abordadas no cinema, mas raras vezes
aplicadas a um casal acima dos sessenta anos. E o argumento de Vanessa Taylor
consegue fazê-lo com a coragem necessária para abrir o debate de uma forma
honesta, abordando temas como o sexo com a abertura necessária. O tabu da
sociedade que é o sexo entre casais de meia-idade, é também tabu para as
próprias personagens, acabando por conseguir transmitir a mensagem de uma forma
bastante direta ao espectador, de uma forma divertida, mas não bizarra ou
caricata. E apesar desse tom de comédia que sempre trespassa o filme, há uma
angústia que persiste grande parte do filme e que é também transmitido ao
espectador.
Nada disto seria possível sem o excelente trabalho dos atores.
Meryl Streep
tem um desempenho que não fica nada atrás dos seus trabalhos mais elogiados e,
na minha honesta opinião, bem melhor do que aqueles que a consagraram nos
últimos anos, inclusive o do ano passado com The Iron Lady (2011). Longe de
todo o aparato visual e até algum exagero interpretativo dos seus últimos
desempenhos, temos aqui um trabalho tão simples, mas simultaneamente tão
complexo e que transmite toda a angústia e expetativa da personagem de um modo
emocionalmente forte. É isto tipo de trabalhos, aparentemente mais simplistas,
que distinguem verdadeiramente os bons atores dos razoáveis. E aqui Meryl Streep
prova-o. Felizmente não está só, porque Tomy Lee Jones tem uma performance assombrosa
e um dos seus melhores trabalhos de sempre, digno uma nomeação ao Óscar. É um
desempenho tão subtil, tão verdadeiro, com toda aquela raiva e energia contidas
e misturadas com a dor e orgulho de um homem de meia-idade, que faz valer todo
o filme.
O único problema de Terapia a Dois é o facto de poder ser facilmente
confundido com a ligeireza das habituais comédias românticas. Porque de facto
não o é. Utilizando um termo recente, é mais uma poderosa "dramédia"
que uma simples comédia dramática, é o retrato de uma faixa etária rara de ver
no cinema com tanta delicadeza, mas abordando um assunto que é facilmente
aplicável a qualquer outro casal de idades distintas. É acessível, delicado,
direto e ternurento como poucos.
Tiago Ramos, in Split Screen
Uma das músicas que fazem parte da banda sonora do filme
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