Já tive um carro da cor dos teus olhos (…)
Esperava por semáforos, sem saber que esperava
apenas por ti. No autorrádio, a tua voz
cantava
fados demasiado velhos até para a minha mãe.
A segunda circular era uma manifestação
pacífica
de para-brisas, as palavras de ordem eram
simples
porque ainda não sabia que já me tinhas
escolhido.
Quando os outros rapazes folheavam revistas de
carros nas aulas de matemática, eu apenas me
interessava por unicórnios e farmácias
abandonadas.
Agora os meus olhos contam quilómetros nos
teus,
procuro papéis entre os papéis do guarda-luvas
e
tenho tanto medo que me vendas em segunda mão.
José Luís
Peixoto
in «Gaveta
dos Papéis»,
Quasi, Vila
Nova de Famalicão, 2008
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